“Se um dia algum ditador banir o Facebook de seu país, ou desconectar totalmente o plugue da internet, será que as comunidades vão evaporar ou se reagruparão para reagir?” Em 2009, Yuval Harari deixou essa provocação no seu livro ‘21 lições para o século 21’. Quase 15 anos depois, só precisamos de uma pequena atualização: Se algum dia as redes sociais deixarem de existir…
Parece impossível, mas quem (como eu) já viu o declínio do IRC, do Orkut e, vamos ser sinceros, do Messenger, entende que até o mundo digital evolui a passos largos. E embora as pessoas possam facilmente se adaptar às novas tecnologias e mudar sem olhar para trás, será que podemos dizer o mesmo das marcas?
No mundo todo, Facebook e Instagram ainda são as redes sociais mais usadas para pesquisar sobre marcas e produtos (segundo o Digital 2023: Global Overview Report). Não é coincidência que essas sejam, também, as plataformas mais utilizadas pelas marcas para aumentar sua visibilidade e conversão. Mas você já parou para pensar nos motivos de tanto engajamento?
A resposta está muito mais ligada à natureza humana do que às redes sociais per se: o ser humano é um animal social
Pertencer é uma necessidade primordial que data dos tempos mais remotos. Antes mesmo do desenvolvimento das sociedades como as conhecemos, o homo sapiens descobriu que viver em bandos era mais seguro. Em ‘O gene egoísta’, Dawkins explica detalhadamente como a natureza social foi selecionada pela evolução natural como uma vantagem competitiva, tendo sido uma característica fundamental que permitiu à espécie humana prosperar.
E o que tudo isso tem a ver com marketing? Simples, o marketing visa atender às necessidades de cada pessoa, do cliente atual e futuro. É sobre criar relacionamentos e, com isso, gerar oportunidades de negócios. Quanto mais profundo o conhecimento sobre o ser humano, mais eficiente será a estratégia.
O que nos leva de volta às comunidades
Há muito tempo se fala em Marketing de Comunidade. Seth Godin, por exemplo, lançou ‘Tribes: We Need You to Lead Us’ em 2008 (muito antes de Zuckerberg publicar seu manifesto sobre criar uma comunidade global). Ele foi uma das primeiras pessoas a discutir como as empresas, organizações e indivíduos podem liderar e inspirar tribos, criando uma visão compartilhada e fornecendo a liderança necessária para a construção de movimentos significativos.
Segundo Godin, as tribos são formadas quando as pessoas se sentem conectadas a algo maior do que elas mesmas e quando encontram outros que compartilham suas paixões e objetivos.
Mas o que é uma tribo se não uma comunidade?
A geração Z tem reacendido esse debate. Não porque as gerações X e Y se sentissem plenamente incluídas na sociedade, mas, provavelmente, porque se sentiam solitárias demais. Ao buscar um mundo mais inclusivo, livre de antigas formalidades e muito, muito mais conectado, os jovens do século XXI também passaram a buscar um propósito.
Uma tribo ou, melhor, uma comunidade, é um espaço onde se pode encontrar pessoas que compartilham das mesmas ideias, têm os mesmos anseios e querem construir algo em comum. E é justamente para isso que a internet está sendo usada: criar/ser parte de uma comunidade, buscar orientação e se informar (nessa ordem).
Você, certamente, tem a sua tribo online (faz parte de quantos grupos no WhatsApp, por exemplo?). Ela pode ser liderada por você mesmo, por um influencer, por uma associação ou por uma marca. Dentro desse ambiente, você compartilha seus pensamentos, ideias, anseios… provavelmente vocês têm até um vocabulário específico dentro do grupo.
Por exemplo, o Wattpad chama os usuários de wattpaders, “read the latest wattpaders stories on Wattpad”. Já na Twitch, há uma linguagem própria, criada pelos users, com termos como “Kappa” (usado para indicar sarcasmo ou brincadeira), “PogChamp” (usado para expressar emoção) e “stream sniping” (o ato de assistir à transmissão de um jogador para ganhar uma vantagem competitiva).
Nesses ambientes digitais, há um compartilhamento de valores e interesses que fazem com que a pessoa se sinta pertencente ao grupo. Isso gera identificação, conexão com outros membros e participação ativa – ou melhor, engajamento.
E é isso que explica o sucesso de tantas plataformas: WhatsApp, Discord, YouTube, Twitch, Tik Tok. Dentro desse ambiente, os criadores de conteúdo fazem com que seus seguidores se sintam parte de uma grande comunidade. E, por isso, o conteúdo compartilhado é também recebido com mais aceitação do que qualquer outro conteúdo.
Como grandes marcas podem usar o marketing de comunidade
Uma comunidade precisa ser nutrida para existir, ela precisa ter valores e compartilhar uma cultura. Por outro lado, ela tem o potencial necessário para ganhar vida própria. Conforme as conexões vão sendo criadas, os próprios membros passam a propor discussões, criar conteúdo e aquecer essa comunidade.
Durante a pandemia de 2020, muitas pessoas viram nessas tribos digitais um espaço seguro para pedir ajuda ou oferecer apoio a outros membros. E isso não se restringe a grupos relacionados ao tema específico de saúde mental, até porque as maiores comunidades do Facebook, por exemplo, são sobre animais, comida e culinária. Isso acontece por causa das conexões dentro desses grupos.
A Dove é uma grande marca que possui sua própria comunidade. Formada por um grupo seleto de consumidores, eles compartilham suas opiniões e necessidades. A marca, por sua vez, usa esses dados para melhorar seus produtos e serviços.
Já a Amazon Web Services AWS, criou uma comunidade que une CTOs do mundo todo, a CTO Fellowships. Nela, além de conteúdos exclusivos para impulsionar suas startups, os CTOs ainda têm a oportunidade de desenvolver seu networking e criar conexões com profissionais que enfrentam os mesmos desafios e compartilham aspirações semelhantes.
Outro exemplo clássico é o da Harley-Davidson. Ela conseguiu criar uma comunidade global on e offline. Muito mais do que o amor pelo produto, os consumidores compartilham um estilo de vida e a paixão pela vida em duas rodas (nem todos os membros são proprietários de uma Harley-Davidson).
O que todas essas comunidades têm em comum é que elas servem às pessoas. O foco não é (e nunca será) o produto em si, mas os valores compartilhados e a troca entre as pessoas. E é claro que toda troca é marcada por conexões reais, experiências e algum conflito.
Afinal, sempre que existir um “nós”, haverá também um “eles”. Essa dicotomia é inerente à tribo e, por isso, também faz parte do marketing de comunidade. Se a marca propõe valores de cuidado com o meio ambiente, os outros são aqueles que não separam o lixo ou que não estão buscando o consumo consciente.
Um fórum de discussão, por exemplo, pode se tornar uma grande comunidade. Nele, os usuários trocam experiências sobre produtos ou serviços, auxiliam outros consumidores e podem vir a criar conexões. Isso acontece, por exemplo, nos fóruns da Apple. Nele, encontramos todos os elementos de uma comunidade forte: usuários de Apple versus usuários de outras marcas, valores compartilhados, espaço seguro onde todos podem desempenhar um papel (perguntar ou responder) e possibilidade de criar conexões com outros membros.
Mas o mais importante de tudo isso é que, caso um ditador de algum país do mundo resolva desligar o plugue e dar fim às redes sociais, as marcas que construíram comunidades fortes não serão prejudicadas. Isso acontece por três motivos:
- Uma comunidade pode ser desenvolvida em plataforma própria, como site, rede de emails, intranet, etc.
- Uma comunidade forte não existe devido a uma plataforma específica. Assim, ele pode migrar facilmente.
- A comunidade é sobre as pessoas, e sempre existirão pessoas buscando pertencer e se conectar com outras pessoas.
Trabalhar bem uma comunidade diz respeito a estratégias de comunicação, interação e engajamento. Se a sua marca precisa de apoio para pensar, repensar e operar um projeto nessa linha, faça nosso diagnóstico gratuito e conte com a ajuda dos nossos especialistas: AQUI.
Lori Sato
Redatora na Agência Pólvora